Brasil e as reservas de potássio para agricultura – Apenas 11% das jazidas estão em terras indígenas, segundo UFMG; projeto que prevê exploração mineral nessas áreas pode voltar à discussão nesta terça, na Câmara dos Deputados
Enquanto produtores agrícolas do país se preocupam com os efeitos da guerra na Ucrânia para o abastecimento de fertilizantes, uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais mostra que o Brasil tem reservas de potássio que poderiam garantir o abastecimento para fertilizantes até 2100
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Atualmente, de acordo com dados da Embrapa, 50% da importação do insumo vem da Rússia e de Belarus.
Segundo o professor Raoni Rajão, do departamento de Engenharia de Produção da UFMG, dois terços das reservas se concentram nos estados de Sergipe, São Paulo e Minas Gerais.
Já entre as que estão na Amazônia, apenas 11% se sobrepõem a terras indígenas ainda não homologadas. Os números foram levantados com base em dados do Ministério de Minas e Energia.
A informação vem no momento em que o projeto do governo federal que busca autorizar a exploração mineral em terras indígenas pode voltar a ser discutido, após dois anos parado.
Líderes de bancadas da Câmara dos Deputados relataram à CNN, segundo apuração de Larissa Rodrigues, sobre uma reunião nesta terça-feira (8) para tratar do assunto.
Os parlamentares contaram que o presidente da Casa, Arthur Lira, quer acelerar a aprovação devido à dificuldade do Brasil de ter o a fertilizantes em meio à guerra entre Rússia e Ucrânia.
Em entrevista a uma rádio de Roraima nessa segunda-feira (7), o presidente Jair Bolsonaro defendeu o projeto e criticou a demarcação de terras indígenas.
“Temos projeto desde 2020 que permite explorarmos essas terras indígenas, de acordo com o interesse do ministério, se eles concordarem, podemos explorar minérios, fazer hidrelétricas. O que o fazendeiro faz na tua terra, o indígena pode fazer do lado”, declarou Bolsonaro.
No entanto, o professor Raoni Rajão não vê da mesma forma. “A afirmação que é necessário mudar a legislação não corrobora”, declarou à CNN.
Já Everaldo Zonta, professor do departamento de Solos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), ainda avalia que as jazidas em terras indígenas trazem o desafio da tecnologia.
“É um potássio que não vai ser conseguido tão cedo, não por problemas ambientais, mas é um potássio em forma de salmoura, profundo. Nós não temos tecnologia ainda”, declarou.
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Como conquistar independência?
O Brasil depende da importação de fertilizantes à base de nitrogênio, fósforo e potássio para garantir a produção agrícola. Eles são utilizados para corrigir o solo e garantir o aumento da safra.
Segundo os pesquisadores Raoni Rajão e Everaldo Zonta, o país tinha independência de potássio até 1990.
“Vem desde a privatização da Vale, que era a grande produtora. O aumento da produção de alimentos, que hoje mantém a balança comercial positiva, se deve ao aumento no consumo de fertilizantes, mas a produção nacional não seguiu a mesma linha”, analisa Zonta.
Os dois professores são unânimes em pedir uma política nacional para o Brasil explorar reservas de potássio para agricultura. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento deve lançar um plano nacional de fertilizantes ainda este mês.
Rajão acredita que o cenário da guerra mostra a importância de se investir no mercado brasileiro, mas defende que é preciso incentivo para iniciar uma concorrência com gigantes internacionais que dominam as vendas.
“O governo federal está preparando um plano de fertilizantes, mas isso a por vários pontos importantes, como equiparar a questão dos impostos. No Brasil, se você produz, você paga 8% de ICMS. Se você importa, não paga imposto. Não faz sentido você ter esse tratamento diferenciado, além de ter a necessidade de uma ação de longo prazo, com estímulos de bancos públicos”, defendeu.
Já Zonta destaca a importância de investimentos em pesquisa para soluções para a busca por fertilizantes.
Estoques para três meses
A Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda) divulgou que os produtores têm estoque de fertilizantes para três meses.
A entidade mantém diálogo com o governo federal para resolver o problema e espera que a guerra na Ucrânia acabe o quanto antes.
Procurado, o Ministério da Agricultura respondeu à CNN que o Brasil tem fertilizantes para garantir o plantio até outubro. E também que prepara uma caravana de treinamento sobre a eficiência dos insumos, na tentativa de garantir uma economia de US$ 1 bilhão em fertilizantes.